sexta-feira, 23 de junho de 2017

Aldeia de Faleiros - Capelins

Faleiros a árvore seca sugere um destino

RITA RANHOLA 13/06/2010 - 00:00
Há quem aqui sempre tenha vivido, mas também há os que vieram ou regressaram para contrariar a "luta desigual" com o Estado, que quer acabar com as aldeias
Uma imponente árvore, apesar de já seca, ergue-se à entrada da pequena aldeia de Faleiros, "perdida" no interior alentejano, onde cerca de uma dúzia de pessoas ainda "teima" em viver, incluindo um casal luso-inglês que ali criou "raízes".
"Num raio de 35 quilómetros, tenho bancos, hospital, lojas, supermercado, advogados. Tudo o que preciso para viver está aqui, no Alentejo", diz Peter Bernthal, de 62 anos. Alto e esguio, como a árvore, e de barbas brancas, o inglês e a mulher, a portuguesa Fernanda, dois anos mais nova, são dos poucos moradores desta aldeia da freguesia de Capelins (Santo António), no concelho de Alandroal. O casal recuperou uma casa comprada em 2002 e até tem um turismo rural que recebe visitantes dos vários "confins" do mundo, mas não atrai nacionais: "Os únicos portugueses que cá vêm são amigos nossos".
"Uma vez, telefonou um português e a primeira coisa que perguntou foi se havia televisão no quarto. E outro queria saber se tínhamos televisão por cabo. Eu disse que não", relata Fernanda, que viveu em Angola e, no Alentejo, reencontrou a "imensidão" dessa sua outra pátria africana.
Os primeiros turistas foram americanos, "à procura de cultura e monumentos", mas já por ali passaram belgas, ingleses, holandeses e até "uma rapariga da Coreia do Sul".
Preferindo expressar-se na língua do país que o acolheu, depois de partir "sem destino" de Rochester, no Sul de Inglaterra, há mais de uma década, Peter gostava de ver um maior apoio ao turismo no Alandroal.
"A última fábrica que abriu no Alandroal foi há 24 anos... O turismo é muito importante e podia dar trabalho à gente nova", defende o inglês, apaixonado pela sua casa alentejana, com "tectos brancos com barrotes pretos de madeira" e "uma chaminé para nos sentarmos lá dentro", que lhe evocam as "casas dos ricos" da sua região natal.
Mas é com tristeza que Peter Bernthal diz assistir ao abandono do interior português: "Vai tudo para Lisboa, Porto, Coimbra e Algarve. Até parece obrigatório, mas as pessoas, aí, não têm condições de vida".
Do lote dos muitos alentejanos que tentaram a sua sorte nos arredores de Lisboa, fizeram parte António João Almas Veva, de 61 anos, natural da sede de freguesia, Montejuntos, e a sua mulher, Isabel do Carmo, de 56 anos, "nascida e criada" em Faleiros.
Acabaram por regressar à aldeia de Isabel nos anos de 1980, desiludidos com o fecho da fábrica onde trabalhava António João, que é agora vendedor ambulante de fruta no concelho.
"Antes, isto estava tudo habitado. Agora, não devemos ser mais de uma dúzia", diz Isabel do Carmo, enquanto olha, atenta à oferta, para o interior da carrinha da vendedora ambulante de peixe que acaba de chegar à aldeia, como é hábito todas as semanas.
Do outro lado da estrada que "corta" a aldeia em duas partes, está a escola primária de que foi aluna, na altura acompanhada por "mais uns 17 ou 18 gaiatos". Há "mais de 20 anos" que foi desactivada e, numa terra onde as crianças são raras, é a actual sede de uma associação de caça e pesca. "Para vizinhos ruins, mais vale estar só", brinca Isabel, sem pensar em deixar a sua casa, enquanto António João traça o destino: "Nem que sejamos os últimos, ficamos cá até morrer".
O jovem Arlindo Dias, de 33 anos, está no primeiro mandato como presidente da junta de freguesia, eleito pelo movimento independente que "conquistou" o município de Alandroal, e quer contrariar a "estagnação" a que a sua terra foi votada. Mas, com um orçamento anual reduzido, o presidente sabe que é "muito difícil" atrair moradores, apostando antes em "pequenas melhorias" benéficas para os que restam.
"Tenho o cuidado de ir de monte em monte perguntar às pessoas quais as suas necessidades e, aqui, vi que a entrada da aldeia, com pasto seco, está desaproveitada. Se plantarmos uma ou duas árvores e pusermos flores e um banco de jardim, este espaço fica mais simpático", sugere.
No interior do país, sobretudo quando se fecham escolas e outros serviços públicos, critica o autarca, trava-se uma "luta desigual contra o Estado", que "quer acabar com as aldeias e concentrar as pessoas todas nas grandes cidades".
"O interior está esquecido, mas, para o país ser de excelência, não podemos deixar morrer estes lugares e aldeias. É como uma árvore, que nasce por ter raízes. Até pode estar muito bonita, mas são as raízes que a alimentam e, se estas secam, mais tarde ou mais cedo a árvore morre", sentencia.

Agência Lusa 



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